
Pintura de Burne Jones (1988) - Perseu salva Andrómeda do monstro marinho

A lenda do ser errante, como é o caso do holandês amaldiçoado, pode ter raízes míticas mais fundas. Lembrei-me que, na grande epopeia indiana Mahabharata, o filho de Drona, Ashvatthaman, é amaldiçoado por Krishna. Com efeito, Ashvathaman lança a sua temível arma sobre os ventres das mulheres dos poucos Pandavas que sobreviveram ao seu massacre, com o objectivo de que elas nunca mais tenham filhos. Para evitar o fim dinástico dos Pandavas, Krishna promete ressuscitar o feto que a nora de Arjuna, Uttara, traz no ventre e que terá o nome de Parikshit. Ora, pelo seu acto, Ashvattaman é condenado por Krishna a vaguear sozinho e errante até ao fim dos tempos. Aqui não existe Senta nem o seu amor redentor do Navio Fantasma de Wagner, mas o mito é, no essencial, o mesmo. A fotografia é a do personagem Ashvatthaman na recriação teatral do Mahabharata por Peter Brook (agora em DVD, na zona 2).
Hoje, em Bayreuth, é dia do "Navio Fantasma" ou, se se preferir, do "Holandês errante". Wagner baseia-se numa lenda de marinheiros que remonta provavelmente a 1641, quando o capitão holandês Van der Decken naufragou no Cabo da Boa Esperança. Ao que parece, o capitão, temendo naufragar, amaldiçoou-se dizendo que navegaria até aos fim dos tempos. O mais curioso é que o Navio Fantasma é ciclicamente avistado. São famosos os avistamentos deste holandês errante pelo rei Jorge V de Inglaterra e por um submarino alemão na segunda guerra mundial. Em termos arquetípicos, esta lenda cruza-se com outras similares, como é o caso do "judeu errante". Errante era vida de Wagner quando compôs esta obra, fugindo aos credores...:-) quase todas as pessoas que viram esta ópera romântica sabem trautear um pouco da sua música.
Enquanto aguardamos pelos acordes do Parsifal em Bayreuth (29 de Julho), com a polémica encenação de Schlingensief, relembro que saiu um cd de música de Wagner com temas escolhidos por este enfant terrible do teatro alemão. Fui logo ouvir o tema seleccionado do Parsifal, "Mein erstes Amt" (Acto III) e a escolha não poderia ser mais sublime! Wagner no seu melhor.
O blog Wagner Operas apresenta mais imagens do Tristão e Isolda, na interpretação do suíço Christoph Marthaler. Mais uma vez se vê a sombra do Anel de 76 sobre as novas produções wagnerianas. Mas enquanto a versão de Patrice Chéreau era brilhante em termos estéticos, sabendo combinar genialmente o sublime e o neoclassicismo, as "cópias" são exactamente aquilo que são: cópias.

Terminou há poucos minutos o Tristão e Isolda de 2005. Como não temos imagens, o Expresso do Oriente, para celebrar o início do festival de Bayreuth, reproduz uma imagem da versão de Wieland Wagner (1962), o neto, já falecido, do compositor. Amanhã teremos novamente o Parsifal de Schlingensief.
Mais uma cena do Ramayana, onde se pode ver Rama - de pele escura, sinal da sua "ligação mítica" com Krishna - e o seu irmão Lakshama preparando-se para atacar o malvado Ravana (à esquerda). É interessante notar que Bharata - outro irmão de Rama - é uma personagem central do Ramayana, mas que se encontra ausente do grande poema que o celebra, Mahabharata, o grande (Maha) Bharata. Bharat, por sinal, é o nome comum da Índia para a grande maioria da sua população.
Será que só os deuses têm mil mãos? Julgo que esta imagem é de Ravana, o asura ou demónio de Sri Kanka (Ceilão), o malvado que raptou Sita, a amada de Rama. Hare Rama, Divas & Contrabaixos!
Esta aguarela de Dante Gabriel Rossetti retrata uma das cenas mais famosas da Divina Commedia de Dante. Trata-se naturalmente da história de Paolo e Francesca de Ramini que se beijaram quando liam o romance sobre Lancelot. O marido de Francesca surpreendeu-os e eles foram mortos. Encontram-se agora no Inferno da Commedia e são visitados pelo poeta, acompanhado de Virgílio.
A estátua de Nefertiti, umas das jóias da arqueologia alemã, descoberta no Egipto em 1912, vai reaparecer novamente em Berlim no próximo mês de Agosto. A estátua encontrava-se no castelo/palácio de Charlottenburg e irá fazer agora parte da enorme colecção de arte egípcia que será exibida no Altes Museum. As colecções que existiam em Berlim Ocidental e Oriental vão ser finalmente reunidas. O interesse alemão pela arte egípcia não é nenhuma idiossincrasia, apenas revela que estamos perante uma nação civilizada. O mesmo se diga de Inglaterra... estive a fazer as contas e, durante este mês de Julho, teremos cerca de uma conferência por dia sobre a cultura egípcia no Reino Unido. E em Portugal? É melhor nem perguntar...
Imagem do coelho mais célebre de Bayreuth que retornará em 2005 num dos mais famosos festivais musicais do mundo (já agora, o de Salzburg também deve estar a começar). Muitas pessoas estranharam a presença deste coelho no Parsifal de Schlingensief. E, no entanto, o coelho é um símbolo trivial de fertilidade e da Páscoa. Como sublinha Lévi-Strauss, no Parsifal joga-se o confronto entre um mundo infértil, embora axiologicamente positivo, e o mundo fértil de Klingsor, mas axiologicamente negativo. E será que alguém consegue esquecer o tema musical da "sexta-feira santa" deste "drama musical sagrado"? Claro que provocou um certo mal-estar o visionamento de um coelho em decomposição. Mas será estranho ao Parsifal a estética decadentista dos finais do século XIX, assim como a visão schopenhauriana do desejo?
O Festival de Bayreuth de 2005 aproxima-se com a apresentação no dia 25 de Julho de uma nova versão do Tristão e Isolda (cf. Spielplan). Vamos ter o polémico Parsifal do ano passado e o Anel vai fazer umas férias...
Há já algum tempo que não via um filme tão interessante como o Melinda and Melinda. Talvez mais importante do que a ideia que presidiu à construção da narrativa e que se consubstancia no "riso das lágrimas", aquilo que é brilhante neste filme é ele próprio: realização, cenários, interpretações, diálogos, Nova Iorque. "Woody Allen", para o dizer em apenas duas palavras.
Mansão neogótica do escritor Horace Walpole situada no "Monte de Morango" (Strawberry Hill). Walpole é consensualmente apontado como o criador da literatura gótica, rompendo com o neoclassicismo dominante, nomeadamente no seu romance O Castelo de Otranto. Ann Radcliffe será a continuadora deste estilo, conferindo-lhe o ambiente romântico que nos é tão familiar.

Dante Gabriel Rossetti, Maria Madalena, 1877.
Quando se cruzam runas, sagas germânicas, pintura do século XIX, o resultado só pode ser William Morris. Aqui recordado através de sua mulher (Jane Burden), neste desenho de Dante Gabriel Rossetti. Jane Burden era considerada pelos pré-rafaelitas o epítome da beleza feminina.