"As Sonatas e Interlúdios para piano preparado marcam o fim de um período e o início de uma nova fase na vida de John Cage .
Depois das experiências realizadas com o piano preparado, Cage fundamenta o seu estilo em toda uma série de ideias filosóficas, que abrangem desde o Budismo Zen às teorias de Meister Eckhart, passando pela obra de Ananda Coomaraswamy.
Pretendendo comprovar através da sua obra musical, o ideal da filosofia budista de negação e consequente esvaziamento do ego como um caminho possível de tornar a realidade perceptível, Cage envereda gradualmente para o abandono da intenção composicional a partir de 1951.
Se, nas suas primeiras obras escritas fundamentalmente para percussão, a fundamental preocupação era a de estabelecer uma estrutura rígida e inalterável que controlasse todo o processo composicional, gradualmente este elemento perde importância, até que por fim se extingue.
Aparece assim subjacente à formulação da ideia de estrutura rítmica, a busca do esvaziar do espírito e da sua libertação de todos os entraves do eu psicológico. Cage tende para uma visão da estrutura rítmica, existente por si só, partindo de uma ignorância do material para abarcar um vasto universo de sons e inclusive o silêncio. Tal implica a independência da estrutura em relação ao conteúdo, sendo a ligação entre acontecimentos musicais e pontos temporais importantes feita mais por coincidência (“luminosa” segundo Cage) do que propriamente por uma prévia intenção. Devido à exploração desta ideia de estrutura vazia, que se torna capaz de abarcar toda uma infinidade de sons sem a manipulação do compositor, Cage concebe a sua composição, baseando-se na alternância intenção/não intenção.
Na obra musical de Cage, o jogo entre conceitos opostos torna-se uma constante, a necessidade de recorrer a métodos bastante determinados para gerar a aleatoriedade, faz com que o par determinação/indeterminação, bem como a transferência da intenção para a não - intenção composicional estejam sempre presentes a partir de 1951.
Neste contexto, as noções de som e de silêncio deixam também de ter o mesmo significado para Cage. Ao entrar no campo da indeterminação, a articulação do som e do silêncio não vai ser feita da mesma maneira. Se até aqui, o silêncio representava um espaço de tempo vazio entre dois sons, a partir de 1951, o silêncio vai ser tratado como um elemento musical de pleno direito, passando a fazer parte do grupo dos materiais, até que por fim, o significado do termo altera-se radicalmente, passando a englobar todos os sons ambientais, ou seja, todos os sons que não fazem parte da intenção do compositor — em suma, sons não intencionais.
O caminho para o Indeterminismo absoluto estava traçado."
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