sexta-feira, 4 de fevereiro de 2005

Justiça Poética

Martha Nussbaum é inegavelmente uma das filósofas mais importantes do pensamento contemporâneo. Alerta-nos, na sua obra, que uma vida empobrecida em termos poéticos terá consequências terríveis nas múltiplas decisões tomadas. Não são apenas os juízes que se pronunciam sobre os actos humanos. Afinal, a esfera da faculdade de julgar amplia-se aos docentes, aos políticos e, em última instância, a todos nós quando detemos algum poder. Será que a decisão que apenas tem em consideração os factos da vida do decisor poderá ser fundamentada? Ricoeur dizia algures que somos aquilos que lemos. A frase pode parecer exagerada e até elitista... mas existem muitos tipos de "leitura". Sem identidade narrativa e poética como pode existir imaginação para alguém se colocar no lugar de outrem? Não faças aos outros o que não queres que façam a ti, dizem-nos tanto Confúcio como a Tora. Esta é a regra de ouro. Para que ela seja justa, e não apenas utilitária, importa que a nossa identidade seja atravessada por essa lente poética de que falava Proust e que nos permite olhar o mundo e os outros através de múltiplas perspectivas e com sensibilidade.

1 comentário:

r.e. disse...

é fascinante como mantens, dia após dia, a sobriedade das escolhas e referências, a erudição sem altivez, a honestidade intelectual, resumindo um prazer de te aqui regressar, sempre, sempre expectante à chegada pela surpresa, sempre estimulado à partida com mais uma luz aberta. um beijinho. J.