quinta-feira, 6 de janeiro de 2005

A Tragédia de Mayerling

Uma das passagens mais enigmáticas do poema The Waste Land é inegavelmente a seguinte:

"And when we were children, staying at the arch-duke's,
My cousin's, he took me out on a sled,
And I was frightened. He said, Marie,
Marie, hold on tight. And down we went.
In the mountains, there you feel free.
I read, much of the night, and go south in the winter." (vv.13-18)

"E quando éramos pequenos e estávamos em casa do arquiduque,
Meu primo, ele levou-me num trenó.
E eu estava assustado. Disse, Marie,
Marie, segura-te bem. E fomos por ali abaixo.
Nas montanhas, aí sim, sentimo-nos livres.
Leio quase toda a noite e vou para o sul no Inverno.” (vv.13-18)

Durante muito tempo, pensei que o arquiduque, referido nos versos, era Franz Ferdinand, cujo assassinato foi o pretexto da primeira guerra mundial. Ora, cada vez mais estou convencido que o arquiduque em causa é Rudolf, o príncipe herdeiro do Império Austro-húngaro, filho de Franz Joseph e Elizabeth (Sissi). Por sua vez, hesito na identidade desta "Marie, Marie": tanto pode ser a condessa Marie Larisch ou Marie Vetsera, a jovem de dezassete anos, a amante de Rudolf. Rudolf e Marie Vetsera tiveram uma ligação secreta que terminou tragicamente num pavilhão de caça numa montanha, na zona de Mayerling, perto de Viena. Ainda hoje se suspeita que eles não se suicidaram, mas que foram brutalmente assassinados. Marie Larisch, da família real, teve apenas como papel ser a mensageira (a "go-between") entre os amantes. Rudolf tinha uma formação liberal e se ascendesse ao trono provavelmente a primeira guerra mundial nunca teria acontecido. Em volta desta família, existem, na verdade, crimes bem estranhos, desde a morte misteriosa do rei Ludwig II da Baviera até ao assassínio da mãe de Rudof, a Kaiserin Sissi, junto ao lago Leman (nome francês do lago de Genebra que Eliot conheceu da pior maneira quando esteve internado por abulia; "junto às águas de Leman sentei-me e chorei"...).
O que está claro é o sentido do último verso (18): "Leio quase toda a noite e vou para o sul no Inverno". Só quem ainda não sentiu a velhice é que não percebe o sentido trivial desta frase... Neste caso, não precisamos de nenhum Poirot :-)

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